foto da revista capa

Expressões envolvendo peixes são comuns na nossa cultura: “peixe ensaboado”, “um peixe fora d’água”, “peixe não puxa carroça”, “vender o meu peixe”, “puxar a sardinha para o meu lado”, e por aí vai. Lições de vida também não faltam: “não dê o peixe, ensine o homem a pescar”, lembra? O título desta coluna é um ditado budista.

A simbologia do peixe é muito forte. O primeiro símbolo cristão foi um peixe, antes mesmo de usarem a cruz. O peixe cristão tem voltado à moda e pode ser visto na traseira de muitos carros de fiéis.

Desde quando morávamos em cavernas, os peixes eram importantes. Estranhamente, as representações na arte rupestre são raríssimas. Aqui no Brasil, podemos ver algumas na Serra do Ererê, na Amazônia, e umas poucas em Lascaux, mas mesmo assim não em número expressivo.

O peixe encontra espaço em quase todas as tradições. Moisés proibiu o consumo de peixes faltando alguma parte, como escamas ou nadadeiras. Os peixes nessa tradição, inclusive, são classificados em comestíveis ou não de acordo com a presença de escamas.

No Egito, os sacerdotes e os reis não podiam comer peixe, mas a população podia. Era tipo um x-tudo de carrocinha, bem popular, mas considerado “impuro”. Em Esna, existem múmias de percas-do-nilo, um peixe azulado bastante comum na região e venerado pelos antigos egípcios. Ainda no Egito, a deusa-peixe Hatmehit é uma das formas de Isis, a deusa da maternidade e da fertilidade.

Em Moçambique, é o peixe-deus Chipfalamfula quem controla os rios.

Na China, o peixe dourado significa harmonia e abundância. Os chineses consideram que o peixe e a água juntos são um símbolo do prazer sexual. Na Turquia, esse lado sex symbol do peixe é tão cotidiano que “peixe de um olho só” é gíria para o órgão sexual masculino.
Na Índia, tem o deus-peixe, Matsya, uma das muitas formas de Vishnu, que derrotou o demônio Hayagriva e salvou a espécie humana da destruição.

No Japão, acreditava-se que o bagre podia prever terremotos. O símbolo de peixe mais famoso tanto no Japão quanto na China é a carpa — símbolo de coragem e vitória — e pode ser vista em incontáveis tatuagens no mundo todo.

No feng shui, os peixes significam sorte, prosperidade, riqueza e sucesso. De acordo com essa filosofia, esculturas com duplas de peixes representam casamentos felizes.

Um dos meus contos prediletos, O velho e o mar, do Ernest Hemingway, conta a luta entre um velho pescador e um peixe grande, um marlim. Esse conto ganhou uma adaptação em animação, de Alexander Petrov, feita com pinturas a óleo sobre vidro que, se você ainda não conhece, precisa ver. É linda.

Não posso esquecer das sereias, ícones de sensualidade e perigo que habitam nosso imaginário desde a Grécia Antiga. O mito diz que, com sua beleza e linda voz, a sereia atrai os inocentes marinheiros para a morte.

E, claro, peixe na astrologia é o melhor dos signos (nasci no dia 12 de março)! O peixe é muito mais próximo dos humanos do que à primeira vista possa parecer. Passamos nove meses envoltos em líquido. Para muitos, a água é a representação do inconsciente, e o peixe é um dos símbolos do Self, a noção psicológica que temos de nós mesmos como indivíduo. Evolutivamente, já fomos peixes. Parece, portanto, natural que o peixe represente tanta coisa em tantas culturas diferentes.

Muitos animais têm representatividade na nossa iconografia, mitologia e simbologia. Escolhi o peixe para esta coluna por motivos óbvios: fica aqui os meus parabéns a todos os participantes e, especialmente, aos vencedores do Peixe Grande.

 

A água turva não mostra os peixes. Revista Web Design, Rio de Janeiro, p. 34 – 34, 01 jan. 2011.