Estive na 54ª Feira do Livro de Porto Alegre e não conseguia parar de pensar sobre como esse negócio de eixo Rio-SP perde o sentido cada dia mais. Com isso em mente, resolvi fazer aqui uma breve e pessoal relação dos eventos que acontecem fora deste eixo.
É importante ressaltar que esta é uma lista feita de memória e baseada em minha experiência pessoal e, portanto, necessariamente falha e incompleta.
Sul
O sul do país está muito bem representado. Pelotas já está em sua 36ª edição. Porto Alegre na 54ª. É um marco impressionante. PoA este ano teve palestras e debates interessantíssimos, eventos para professores, shows de música e contadores de estória para a criançada. Caxias do Sul está em sua 24ª edição e tem um perfil mais voltado para escolas públicas. Santa Maria está começando mas já promete. Tem ainda a Feira Internacional do Livro de Foz do Iguaçu, a de Jaraguá do Sul, Joinville, Cachoeira do Sul…
É claro que as feiras do livro são feitas para vender livro mas também me parece bastante óbvio que o modelo centavos de desconto faliu e que é necessário agregar valor (odeio esta expressão) e oferecer conteúdo também. Afinal, para economizar uns trocados, compro pela internet e nem pago a condução. O que faz um ser humano levantar de sua confortável cadeira e ir até, digamos, a zona portuária ver livro? Posso garantir que não é um pacote pague 3 leve 4.
Sudeste
Minas Gerais, para quem não sabe, é o centro mais tradicional de produção literária infanto-juvenil. É de lá a primeira especialização brasileira no assunto e o estado acabou virando centro de referência na área. A literatura infanto-juvenil é a mais difícil de produzir. A imagem e o texto tem importâncias e significados muito mais interligados e impactantes do que qualquer outra. Além disso, é uma literatura que precisa levar em conta uma cabeça em formação e isso por si só já é algo muito delicado e complexo. Poços de Calda é, sem nenhuma dúvida, parada obrigatória no circuito literário. O maior evento do estado é a Bienal do Livro de Minas e conta com uma presença grande de escolas locais, representanto aproximadamente 15% de sua visitação.
A Feira do Livro de Ribeirão Preto é tradicional e um dos eventos mais importantes do meio, daquele tipo de presença obrigatória. Ano passado chegaram a ter recital de orquestra sinfônica e mais de 450 eventos culturais, incluindo workshops e oficinas. Novamente, não precisa ser um físico nuclear para perceber o padrão “conteúdo é a chave” aqui, certo? São José do Rio Preto também marca presença no circuito e criou até mesmo uma rádio para transmitir ao vivo entrevistas e promoções.
A região sudeste tem também as Bienais do Rio de Janeiro e de São Paulo, além da Primavera dos Livros e vários outros eventos importantes, mas como a idéia desta relação é justamente sair do eixo Rio-SP, não vou falar a respeito.
Centro-Oeste
A Feira do Livro de Brasília, como era de se esperar, tem um perfil muito ligado a programas de governo (Proler e etc) e ao Minc. Está em sua 27ª edição.
Norte
Mossoró, também no Rio Grande do Norte, tem uma história linda de resistência. Não era especialmente escravocrata e fundou a Sociedade Libertadora Mossoroense em 1883. Pouco depois a cidade era solo fértil de movimentos feministas e acabou ficando conhecida pelo Motim das Mulheres. Resistiu ao cangaço e parece lutar bravamente contra a estratificação literária e os efeitos negativos da globalização, com seus títulos comprados a peso de ouro na Feira de Frankfurt. O Prêmio de Cordel, por exemplo, deveria ser pauta obrigatória em toda mídia nacional.
Nordeste
A Bienal do Livro de Natal tem uma missão híbrida: ao mesmo tempo que promove várias atividades culturais, precisa ser também um centro de distribuição para toda a região Norte e se estas tarefas isoladamente já são difíceis, imagine fazer as duas coisas ao mesmo tempo.
A Bienal Internacional do Livro do Ceará está em sua 8ª edição e parece querer seguir os moldes das bienais de São Paulo e do Rio. O convidado especial da última edição foi o Chico Anysio e isso já diz muito.
A Bienal do Livro de Pernambuco, em Recife, aposta no conteúdo e promove até mesmo um aulão de literatura. Considerando que o faturamento de 10 dias de feira foi de R$ 12 milhões, posso afirmar sem riscos de que foi uma aposta acertada.
A Bienal da Bahia, assim como todas as outras, tem diversos eventos paralelos. O mais simpático deles é o Boteco Filosófico, integrado à central de debates, com direito a petiscos e chopp gelado. Deu até vontade de debater filosofia agora, não foi?
A Bienal do Livro da Paraíba tem como slogan “um país se faz com leitura”, uma versão de algo que Monteiro Lobato dizia com freqüência: “Um país se faz de homens e livros”. Sempre uma boa referência.
A Feira do Livro de São Luís contou, em sua última edição, com Arnaldo Antunes e isso é suficiente pra mim. Sou fã dele. Ok, ok, eu falo um pouco mais. A feira teve palestras, café literário, lançamentos e tudo mais. O que eu mais gosto na feira de São Luís é o destaque para os escritores locais. Só na última edição, foram 53 lançamentos e relançamentos de escritores maranhenses.
Em resumo…
Claro que é importante conhecer o mundo mas a cultura como um todo não pode esquecer sua identidade. Chega de enlatados.