Uma das coisas que eu mais defendo é que criar é, fundamentalmente, uma questão de linguagem. O audiovisual não é exceção. Existem alguns canais no Youtube que se dedicam a analisar vários aspectos diferentes da linguagem audiovisual. Os meus favoritos são: Entreplanos, Copião e Quadro em branco.
Já que estou supondo que você não seja e não queira ser um especialista no assunto, mas alguém que quer melhorar a qualidade de seus vídeos, você precisa se preocupar principalmente com enquadramentos, ritmo e cortes. Além de, claro, ficar atento se os recursos que você está utilizando conseguem traduzir a ideia ou o conceito que você quer transmitir. Será que isso é importante?
Sim, E, por isso, criei este rápido guia vai se concentrar nestes três elementos e em seu impacto na construção de uma linguagem audiovisual consistente. Em resumo: mesmo que você não vá fazer, precisa saber reconhecer quando isso é bem feito.
O que são e por que criamos enquadramentos no audiovisual
O enquadramento cinematográfico depende de três elementos: o plano, a altura do ângulo e o lado do ângulo. Para você entender, os planos são: aberto, médio, fechado, geral, conjunto, americano, meio primeiro plano, primeiro plano, primeiríssimo plano, detalhe. A altura do ângulo se divide em: normal, plongée, contra-plongée. E, finalmente, o lado do ângulo se divide em: frontal, 3/4, perfil e de nuca. A linguagem do enquadramento é muito forte e rapidamente percebida pelo seu público.
O Homem Aranha, por exemplo, é frequentemente retratado em plongée. Plongée significa mergulho em francês. Ou seja, é quando a câmera “mergulha” na cena, mostrando a partir da visão de cima. O personagem do Aranha é humano, tem dúvidas, falha e é adolescente. Portanto, não está acima do leitor, está em uma situação hierárquica igual ou inferior.
Já o Batman é frequentemente retratado em contra-plongée (visão de baixo, olhando para cima). É um personagem milionário e poderoso. Não sei vocês, mas eu não tenho mordomo. O Batman está, considerando 99% da população, em uma posição hierárquica (ou, no mínimo, financeira) superior.
Para complementar, o site CineMundo fez um guia bem bacana sobre enquadramentos. O importante aqui é perceber que o enquadramento é também uma parte importante da linguagem, que comunica algo.
Qual seria o ritmo ideal de uma peça audiovisual?
Ritmo tem relação com a construção (e a quebra) de expectativa. É importante lembrar que o audiovisual, assim como a música, é uma comunicação que acontece no tempo. Ou seja, nosso cérebro armazena cada frame, aguarda o próximo, junta as informações e atribui sentido.
A imagem única, estática, acontece no espaço, não no tempo: percebemos todas as informações de uma forma plana, de uma vez só. Se esse assunto te interessa, recomendo O mundo codificado, do Vilém Flusser.
Então, se é algo que se realiza no tempo, o ritmo é uma das partes essenciais. Podemos pensar o ritmo tanto em termos plásticos quanto narrativos, mas o mais importante é que você conheça o Efeito Kuleshov, que diz, grosso modo, que a ordem com que recebemos as informações altera o seu sentido ou significado. Com as ferramentas digitais, de edição não linear, é fácil experimentar com a ordem dos seus planos ou cenas, até conseguir transmitir a sua ideia da melhor forma possível. Recomendo que você assista o vídeo “A psicologia da edição: montagem cinematográfica“.
E os cortes? Qual a sua função na construção de uma linguagem audiovisual?
Os cortes, além de contribuir com ritmo, também comunicam e nos induzem à compreensão das transições. Como passamos de um plano para outro é uma escolha que, assim como as demais, comunica algo.
Fique atento que o uso dos cortes muda a sua conotação conforme a época. O jump cut, por exemplo, que é quando cortamos um plano para esse mesmo plano mas em outro momento, era recebido com estranhamento até pouco tempo atrás. Esse estranhamento era usado conscientemente, para causar desconforto no espectador. Ferramentas como o Youtube ou o TikTok acabaram popularizando o jump como linguagem e hoje nem notamos mais.
Outra coisa relevante é que, cada vez mais, você compete pela atenção do seu público. Então, não enrole para dizer a que veio.
Um bom exemplo a seguir é o do Tarantino, que começa a contar a história já nos créditos iniciais.
O que está esperando? Mãos à obra! Ou melhor, mãos à câmera!
Separei alguns conteúdos extras para ajudar você a estudar um pouco mais sobre linguagem audiovisual
Vídeos:
- O que é a regra dos 180 graus?
- Tipos de cortes
- Análise da Edição de Os intocáveis, de Brian De Palma – por algum motivo, essa análise não menciona a óbvia citação à cena da escadaria de Odessa, em O encouraçado Potemkin (1925), de Serguei Eisenstein.
Leituras:
- Guia do audiovisual: os principais termos que você precisa saber
- Tipos de cortes: André Sarti
- A forma do filme, do Sergei Eisenstein
- O sentido do filme, do Sergei Eisenstein
- Num piscar de olhos: A edição de filmes sob a ótica de um mestre, do Walter Murch
- A história do cinema para quem tem pressa, do Celso Sabadin
- Sobre a história do estilo cinematográfico, do David Bordwell
E, claro, ver os clássicos, os mestres. Se eu vi mais longe, foi por estar sobre ombros de gigantes, já dizia o velho Newton.
Publicado nos Pensadores Criativos, em 10/03/2021