escrito a quarto mãos com Elvira Vigna, publicado no Aguarrás

Está no Paço Imperial (RJ) a exposição “Oscar Niemeyer – Minha Arquitetura, 1937-2005”. A curadoria foi bem sucedida na difícil missão de fazer uma exposição à altura do nosso maior arquiteto e ao mesmo tempo manter a identidade do espaço.
Paredes vermelhas, composições gráficas modernistas, lembranças do Avant-garde, relacionamentos gráficos à la Fibonacci e seções áureas nos mostram uma montagem cuidadosa para Niemeyer nenhum botar defeito.
Para entender Niemeyer é necessário esquecer Bauhaus.
Para entender Niemeyer é necessário lembrar que “a vida é mais importante do que a arquitetura” e que Oscar Niemeyer é, essencialmente, um homem político. Ele usou, a vida inteira, arquitetura como ferramenta de transformação. Ao transformar o espaço e o seu respectivo uso em uma ação justa e para todos, Niemeyer transformou o mundo e mudou a nossa forma de pensar e, principalmente, interagir.
O curador cumpriu o seu papel de nos mostrar a síntese do humano e não caiu na fácil armadilha de fazer do espaço apenas uma vitrine para a obra de terceiros. Por mais que a gente se maravilhe com os desenhos, plantas, maquetes e fotografias da obra de Niemeyer, lembramos o tempo todo do homem e da vida.

“Camarades,
Le siege du P. C. F. [Partido Comunista Francês] a pour moi la plus grande importance. Il represente plus de 50 ans de lutte contre l’oppression capitaliste.” – O. Niemeyer

“A vida é mais importante do que a arquitetura. Que um dia o mundo será mais justo e a vida a levará a uma etapa superior, não mais limitada aos governos e às classes dominantes, atendendo a todos, sem discriminação.” – O. Niemeyer

Os ângulos eram todos retos, nos Armazéns Gerais do Porto do Rio de Janeiro, em 1743.
Mas, como em outras construções do Brasil do século XVIII, havia as janelas e, nelas, as curvas que iriam inspirar Oscar Niemeyer nos prédios modernos de Brasília.
Por isso, a exposição em homenagem a Niemeyer do Paço Imperial, ex-Armazéns, tem um algo mais além do que ali está contido – a obra do nosso arquiteto maior, desde seu começo em 1936 até 2007, com o recém-desenhado Monumento a Simón Bolívar, de Caracas.
Não são só as janelas que lá se apresentam em seus vários modelos de época: com duas folhas, vedadas por treliças de ferro ou rasgadas em sacadas ou guarda-corpos – todas elas com as bandeiras arredondadas que serviriam de base para as curvas modernas do arquiteto. No salão do térreo, onde se encontra a visão cronológica das obras, a entrada, ao lado da cafeteria, se abre para o espaço onde os três arcos do teto dialogam com o que ali está exposto. Da mesma maneira, a instalação, cuidadosa, tem estandes redondos e retangulares e é pontuada pelo vermelho. Na primeira parede, o desenho da Universidade de Constantine, em Argel, está sobre um chapado de vermelho vivo, o mesmo vermelho com que foi pintada a marquesa desenhada por ele e a filha, Anna Maria Niemeyer, e que ocupa o centro do espaço. Assim, cores e arcos acolhem e continuam o que perto deles se apresenta.
Uma de suas esculturas em ferro tem a iluminação de modo a jogar a sombra para a parede. E a peça, que é levíssima, fica mais leve ainda, no desenho formado na parede.
É esse cuidado de instalação e curadoria (Lauro Cavalcanti) que faz com que a visita adquira uma motivação a mais. Afinal, a obra do artista é bem conhecida. Mas por ser apresentada do jeito que é, há um ganho na visita.
No andar de cima, a sala com os escritos é outro primor. De um lado, em um fundo cinza, o mesmo vermelho – cor preferida do artista – dá uma ilusão de quebra do plano, de um 3D ótico, no desenho de colunas, à mão livre. Na parede em frente, o texto é a dimensão extra, um 3D conceitual.
E, ainda no andar de cima, a escultura Espaço V, com suas curvas que saem da linha reta, foi posta perto de uma quebra na retitude da parede. Era o melhor lugar. Como se fosse feito para a obra, ou vice-versa.