Acompanho o trabalho de Mauricio Planel já tem um certo tempo e sempre gosto muito do que vejo. Quando meu editor, Mauro Amaral, me perguntou se poderia escrever algo a respeito da oficina que Planel fará no Rio, a resposta foi automática.
Primeiro, algumas definições. Colagem, apesar de não ser algo tão antigo quanto têmpera, é uma técnica artística que pode ser traçada no mínimo até as iluminuras e suas folhas de ouro. Claro que se abrirmos a definição para o processo, e não apenas o resultado final, certamente vamos encontrar alguém que diga que a mão decalcada na caverna já era um processo de colagem, mas tenho cá minhas dúvidas sobre isso.
O nome da técnica é bem auto-explicativa. Colagem consiste em unir/colar elementos visuais (texturas, imagens, cores, formas, etc) em uma nova composição, resultando em um novo significado. Em tempos de repensar autoria e criações colaborativas, nada mais contemporâneo.
Os exemplos são muitos, mas só para citar alguns dos artistas que usaram colagem, lembro de Matisse, Picasso, Georges Braque, Duchamp e Man Ray.
Os trabalhos de colagem de Matisse, por exemplo, são tão ou mais conhecidos que suas pinturas e esculturas. E, no caso dele, é um trabalho amadurecido.
“Minha educação consistiu em perceber os vários meios de expressão da cor e do desenho. Minha formação clássica naturalmente me levou a estudar os mestres, a assimilá-los o máximo possível considerando o volume, o arabesco, os contrastes, a harmonia, e a apresentar minhas reflexões em meu trabalho a partir da natureza, até o dia em que me dei conta de que devia esquecer a técnica dos mestres, ou melhor, compreendê-la de uma maneira particular. Não é essa a regra de todo artista de formação clássica?” (MATISSE in FOURCADE, 2007: 177)
A colagem, antes de ser técnica, é pensamento. É necessário um crivo similar ao de um curador para que a seleção dos elementos esteja condizente com o discurso, com aquilo que o artista quer dizer. O discurso do artista é o que o define.
“É preciso que haja uma necessidade, tanto em filosofia quanto nas outras áreas, do contrário não há nada. Um criador não é um ser que trabalha pelo prazer. Um criador só faz aquilo de que tem absoluta necessidade. Essa necessidade — que é uma coisa bastante complexa, caso ela exista — faz com que um filósofo (aqui pelo menos eu sei do que ele se ocupa) se proponha a inventar, a criar conceitos, e não a ocupar-se em refletir, mesmo sobre o cinema. Eu digo que faço filosofia, ou seja, que tento inventar conceitos.” (DELEUZE, 1999)
E, claro, já que estamos nas definições, não posso esquecer de oficina. Oficinas são uma orientação didática prática. Ou seja, é “mão na massa”, você aprende fazendo.
A oficina de Planel será de apenas um dia, 23 de julho, das 13 às 19h, no Rio de Janeiro, para você sair de lá com aquele gostinho de quero mais na boca.
Aproveitei a simpatia de Planel para uma rápida entrevista.
Mauricio, você pode contar para os leitores do Carreira Solo como foi a sua aproximação com a colagem? Como essa técnica começou na sua vida?
Morava em Petrópolis perto do Rio de Janeiro, trabalhava em um jornal local na parte gráfica e aquele universo todo me chamava muito a atenção. Paralelamente fazia os meus freelas para gráficas e confecções. Estudando em um atelier, surgiu um livro sobre os movimentos artísticos e dentre eles a colagem, no mesmo instante foi uma identificação total. Depois disso fiquei mais atento e integrei essa técnica no meu trabalho de ilustração.
Quais são as suas referências? Que artistas você gosta, acompanha? O que gosta de ler, ouvir, etc?
Os artistas clássicos que você citou acima são fundamentais para toda a pessoa que trabalha com artes visuais. Hoje em dia temos facilidade de conhecer muita gente boa através da internet. Dos artistas que trabalham com colagem hoje me dia aqui no Brasil acompanho sempre o trabalho de Daniel Bueno, Miran, Tide Hellmeister e Eduardo Recife. Mestres nas artes visuais.
Trabalhando com ilustração, além de praticar todos os dias, você tem que estar sempre em dia no que acontece no mundo, ter uma cultura geral ampla. Livros, revistas, blogs são parte do cotidiano, com certeza a leitura aguça a criatividade.
Mauricio, como vai ser a sua oficina? Quantas pessoas no máximo, o que precisa levar, quanto custa? Passa pra gente alguns detalhes práticos, por favor.
Já realizei esta oficina anteriormente e o resultado foi positivo. Nesta versão serão apenas 5 alunos, para uma atenção redobrada. O projeto que vai ser criado é uma capa de LP, daquelas antigas onde tantos artistas gráficos criaram obras geniais. O aluno leva apenas a vontade de aprender, todo o material é fornecido.
Você pode deixar algumas dicas para quem quer fazer colagem mas infelizmente não poderá ir à sua oficina?
Para começar: adquirir revistas e livros antigos e cortar, pensar e colar, pesquisar bastante e iniciar sem medo. Não existe um resultado certo ou errado, existe o seu resultado. Praticar sempre, visitar sites de artistas da colagem e deixar a criatividade rolar!
Obrigada!
Serviço visual!
Referências bibliográficas
DELEUZE, Gilles. O ato de criação: palestra de 1987. Folha de São Paulo. Ilustrada. 27 JUN 1999.
FOURCADE, Dominique (org). 2007. Henri Matisse: Escritos e reflexões sobre arte. Trad. Denise Bottmann. São Paulo : Cosac & Naify. 400p.