Chegamos. A primeira providência é ficar de chinelos. A segunda, praia.
Enquanto profissionalizo o método de transformação rápida de paulistana honorária em camarão queimado, passam vendedores de mate, óculos de sol, canga, biquíni, milho verde, sorvete, cerveja, água, refrigerante, cocada, hambúrguer, caixa de som bluetooth, mel, bolo, protetor solar, bonés, chapéus, viseiras, óleo, chaveiro, cuscuz, capa de celular, biscoitos globo, bolsas, pamonha, miniventiladores USB, pulseiras, brincos, cachorro-quente, sacolé, comida árabe, headfones, salada de frutas, empada, chinelo, camisas, vestidos, bitcoin… Fiquei esperando alguém oferecer um notebook, assinatura de revista e lápis de cor.
Finalmente, água de coco.
Peço um coco.
O vendedor tem uma tornozeleira eletrônica, me tirando à força do estado onírico em que estava.
O Rio de Janeiro não é para amadores.
“Está matando as saudades do Rio?”, invariavelmente me perguntam. Sempre respondo a mesma coisa: sinto saudades de pessoas, não da cidade. Claro que essa resposta vale para absolutamente qualquer lugar no mundo, mas não importa.
Eu menti. Não tenho saudades apenas das pessoas. Tenho da comida também. Em São Paulo existe um surto coletivo de achar que filé Osvaldo Aranha se faz com alcaparras. Desculpe, está errado. Está só errado. Filé leva alho. De preferência, alho o suficiente para garantir a nossa segurança no caso de vampiros existirem.
Vamos almoçar.
A instituição carioca de almoçar de chinelos, pé cheio de areia e bunda molhada em um restaurante é algo que também me faz falta. Ok, eu sinto saudades de algumas coisas da cidade. Não o suficiente para querer morar no Rio novamente, mas sinto.
Descanso, banho, hidrante, trabalho.
No dia seguinte, somos surpreendidos pelo feriado do dia 20 de janeiro. Já tinha esquecido dele. Tudo fechado. Para meu desespero, inclusive a sorveteria. Tentamos shopping. Fechado. As coisas só abrem meio-dia. Nem 48 horas de Rio e já estou com saudades de São Paulo.
Reclamo com filho sobre a internet na estrada. “Chegando em São Paulo, melhora”, responde. “Chegando em São Paulo melhora tudo.” Nós somos uma vergonha como família carioca.
No fundo, o que eu queria mesmo é que São Paulo tivesse praia, filé com alho e chinelos.
Aceito só os chinelos.
Crônica publicada no Rascunho em 26/01/2023