O LinkedIn é uma rede social muito estranha, onde pessoas são sempre gratas a seus empregadores, mesmo no momento em que são demitidas.
Publicar print de evento pelo Zoom com “gratidão pelo aprendizado”, então, me parece algo saído de um filme do David Lynch. Aprendemos no ambiente de trabalho? Claro. Aprendemos via Zoom? Claro. 99% das reuniões são inúteis? Claro.
Completarei, ano que vem, 40 anos de carreira. Conto a partir da primeira vez em que me pagaram por um trabalho. Até o presente momento, ainda não participei de uma única reunião — presencial ou remota — que não pudesse ter sido um documento compartilhado no Google Docs. Sim, estou ciente que comecei a trabalhar em 1982 e o app foi lançado em 2005.
Não que eu ache impossível gostar do lugar onde se trabalha, muito pelo contrário. O que me parece improvável é que todo mundo goste do lugar onde trabalha.
De toda forma, volta e meia aparece alguém feliz por conta de alguma ação com neutralidade de linguagem. Recentemente vi uma foto de um kit de boas-vindas onde lia-se: “Bem-vindx à (Empresa)!”.
Aquilo causou em mim uma fúria conservadora da qual não me orgulho. Veja bem, eu também acho que somos seres de linguagem, que o idioma é vivo e que a neutralidade é inclusiva e necessária. O que me irrita não é o quê, o onde, o quando e muito menos o porquê. O que me tira do sério é o como.
A impressão que tenho é que muitas vezes a adoção dessa grafia impronunciável acontece apenas por questões de marketing ou por incompetência na escrita.
O humorista Kaya Yanar, no show Made in Germany, avant la lettre, reclamava dos gêneros dos artigos. A birra dele era com o idioma alemão e ele sugere que todos adotem o “the” do inglês. Se você compreender o idioma, procura no YouTube por “Kaya Yanar der die das”.
Sim, seres humanos são complexos e heterogêneos e é óbvio que todos devem se sentir representados e incluídos.
Eu posso escrever exatamente a mesma coisa no feminino: Sim, pessoas são complexas e heterogêneas e é óbvio que todas devem se sentir representadas e incluídas.
Ou, ainda: Sim, possuímos complexidade e heterogeneidade e é óbvio que devemos ter representação e inclusão.
As 3 opções são inclusivas e neutras por não assumirem o gênero do indivíduo.
Mas e quando a construção da frase exige um substantivo que impõe seu gênero ao sujeito? Quero crer que, na maioria das vezes, existem soluções mais elegantes.
Ao invés de “Bem-vindx à (Empresa)!”, podemos escrever “A (Empresa) lhe dá as boas-vindas!”. Pronto, neutro.
Mais alguns exemplos.
(Pessoa) é jogadorx do (Time) — (Pessoa) joga pelo (Time).
Xs colegas de trabalho dx (Pessoa) – Colegas de trabalho de (Pessoa).
Xs professorxs entraram em greve — Docentes entraram em greve.
(Pessoa) é minhx amigux — Sou amiga de (Pessoa).
(Pessoa) é muito disciplinadx — (Pessoa) tem muita disciplina.
Existem, naturalmente, casos onde essa construção é um pouco mais difícil. Queridos leitores, por exemplo. A opção “queridas pessoas que leem” é válida mas pelamor, né?
Em alguns casos, entre acabar com o idioma ou com a inclusão, que se dane a última flor do lácio. Pessoas são sempre mais importantes.
Entretanto, deixo aqui meu pedido para que você raciocine um pouco mais antes de adotar x, @, e, u ou seja lá qual for a substituição da sua preferência. Muitas vezes existem soluções melhores.
Crônica publicada no Rascunho, em 29/07/2021