Eu sempre soube que não deve ser fácil ser meu filho. Imagino consequências. Até a semana passada, acreditava ser eu a culpada por todas as esquisitices do meu filho, já que o pai dele é relativamente normal. É dessas pessoas que tem uma profissão definida, horários, essas coisas estranhas. Então, eu tinha essa imagem de que não apenas meu filho era um exemplar único e estranho, estranhamente único e unicamente estranho, como achava que eu era a integral responsável por isso. Até a semana passada.

Semana passada vejo meu filho contando sílabas com os dedos no meio de uma conversa de WhatsApp. Aí termina balbuciando no final “to-mar-no-cu”. Semana passada descobri que meu filho e seus amigos – que não foram criados por mim, vejam bem – trocam insultos com métrica.  Cada despautério é devolvido na mesma métrica e com rima. Meu filho fica felicíssimo quando descobre uma boa. Questionei. Recebi como resposta que não, não é nenhum exagero, já que eles não se preocupam em “fechar alexandrinos”. Que é bom quando “fecha em doze” mas que tudo bem se não. Respondi que claro, ele tinha razão, afinal, se contavam doze é porque eram super modernos, porque se fossem arcaicos mesmo fechariam em quatorze. Eu esperava uma risada. Ele apenas sorriu, provando que é mesmo meu filho.

Semana passada descobri que tenho um filho que sabe o que são versos alexandrinos. E pior, muito pior, sabe como usá-los.

Semana passada fiquei sabendo por fofoca (adolescentes falam) que filho, atrasado, lendo de última hora um livro para uma prova (é meu filho mesmo), esconde o livro sob a carteira durante uma explicação, na aula de Estudos Literários, que julgou desnecessária. Concentrado, não vê a professora (puta da vida) se aproximando. Certamente imaginou que ele estava no celular ou algo do gênero. A professora vê o livro. Dizem as testemunhas que a pobre coitada chegou a gaguejar “não, é, leitura é importante, veja bem…” Ok, não é fácil ser meu filho mas também não deve ser nem um pouco fácil ser sua professora. Ser sua mãe, entretanto, é bem sussa, diboas.

Ainda semana passada, comentando sobre o último livro da avó, Como se estivéssemos em um palimpsesto de putas, completa, feliz da vida: “o título é uma redondilha maior perfeita, reparou?”

Semana passada acabaram todas as minhas esperanças de ter alguém nessa família que soubesse ganhar dinheiro.

Publicado no portal Vida Breve em 26 de junho de 2017.